sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Corredor

Era um corredor daqueles bem grandes e com inúmeras janelas. Em umas tantas horas da tarde, a luz transpassava os vidros coloridos – cuidadosamente feitos em forma de mosaico – de um modo que era possível ver os feixes de luz ao longo do corredor. O piso era de madeira, dando a impressão que ele localizava-se em um prédio antigo o suficiente para suportar a magnitude da luz que o inundava.

Em uma das pontas, um menino, juntamente com seu tutor, esperava a passagem de alguém. O garotinho parecia eufórico e ao mesmo tempo extremamente preocupado, tanto que uma ruga se formava em cima de sua testa. Estava vestido em um conjunto de moletom, os cabelos estavam bem penteados para o lado direito e os tênis brancos estavam limpíssimos. O visual era alinhado demais para um menino de uns 8 anos, o que fazia qualquer um que o visse acreditar que quem ele esperava era importante o suficiente para fazê-lo até lavar os tênis.
Numa das pontas do corredor ouviu-se um forte estampido. Era evidente que uma porta com uma tranca bem grande havia sido aberta, e, logo em seguida, em um outro estampido, a porta se fechou. O garoto imaginou que lá vinha quem ele tanto aguardava. Quando ele olhou a mãe vindo acompanhada por um policial (que mais parecia um guardarroupas de tão grande que era) lembrou do que havia acontecido e o porquê ela estava ali.

Em uma tarde quente de verão a mãe havia chegado à casa com o novo namorado. O cara passava a impressão de que era envolvido com algo perigoso. O menino torceu o nariz para ele, e, logo em seguida, ouviu a sirene da polícia. Muitas viaturas pararam na porta da casa e os policiais, todos fardados, entraram quebrando tudo. Sem perguntar nada, renderam a mãe do garoto e começaram a revirar suas coisas. Dentro da grande bolsa vermelha que ela carregava, o policial encontrou um pacotinho com algumas gramas de cocaína, e, embaixo do assoalho da casa, outro policial encontrou a balança que o dito namorado usava para pesar a droga, que mais tarde seria vendida para algum viciado. Foi assim que a mãe do menino foi presa e o namorado mal-encarado, por ter nível superior completo, foi para a delegacia com uma intimação para julgamento e após algumas horas foi liberado.

Quem acompanhava o garoto era o advogado da mãe. A família tinha razoáveis posses, pois o pai do garoto, morto já havia alguns anos, tinha deixado um escritório de contabilidade que rendia um bom lucro mensal. Era o suficiente para manter o menino em uma escola particular e dar a ele todos os video-games que ele poderia usar e dar à mãe todos os sapatos e bolsas que ela gostava.

O pequeno menino desprendeu-se de sua lembrança e saiu correndo em direção aos braços da mãe. O advogado tentou freiá-lo em vão, porque seus minúsculos ombros escaparam por entre os dedos do defensor da lei. Com os braços abertos e os olhos cheios de lágrimas, o garoto corria e a mãe chorava lembrando-se do pedido que havia feito ao advogado dias antes da data do julgamento ser marcada. “Leve meu filho para me esperar passar pelo corredor do Fórum. Essa será a única hora que eu conseguirei vê-lo porque provavelmente eu serei condenada”, disse a mãe ao homem de terno que a defendia.

Ela seria condenada porque, algumas horas antes do julgamento acontecer, a família do então ex-namorado havia a procurado. A proposta era que ela dissesse que era culpada para ele sair ileso. Caso contrário o menino iria pagar pelo crime da mãe com a vida. E, enquanto o filho não fosse morto, eles não iriam ficar satisfeitos.

Em um violento gesto o policial colocou o braço esquerdo na frente do menino e jogou-o para o canto do corredor. Ele chorava desesperadamente e a mãe em prantos foi arrastada para dentro da sala de julgamento. O garoto ficou sem o abraço da mãe e ela soube imediatamente que não veria o filho crescer, pois passaria boa parte de sua vida na cadeia. Assim o menino passou pelo corredor como provavelmente tantos outros meninos já passaram. Naquela noite ele dormiu pensando que o policial não poderia ter filhos, tamanha a frieza com que ele foi lançado longe da mãe pelo homem de farda. Então abraçou o ursinho de pelúcia que ganhou da avó e dormiu. Durante o sonho uma lágrima escorreu de seu pequeno olho. Assim que ele acordou pensou duas vezes antes de gritar 'MÃE' porque sabia que ela não iria correr para o quarto e acalmá-lo. Ficou quieto e dormiu, visto que estava desamparado dentro de sua própria casa.

Texto: Luiza Slaviero

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