domingo, 24 de outubro de 2010

Um conto de eleição

“Vai, corre! Faz a foto, cara!", gritou pra mim o motorista do carro de reportagem, que há alguns meses – desde que começou a dirigir para o jornal - teve a vida inundada de fotojornalismo.

Era um garotinho de uns oito anos, todo maltrapilho, juntando os santinhos que traziam a cara de um determinado político. Era a foto do garoto que chamou a atenção do motorista. O pequeno moleque juntava os papeizinhos para vender por quilo na cooperativa de papel, fui descobrir depois. O piá Francisco, que aparentava um bixo de tão sujo que estava, parecia crente da vitória do tal político.

Na madrugada em que conheci Francisco ele me disse que o futuro dele já estava perdido porque havia começado a “trabalhar” como “aviãozinho” para o dono da comunidade. Uma garoa fina caía e a noite quieta, como sempre, estava de congelar os ossos. Eu, com três blusas, me senti envergonhada por ver o menino com uma calça de moletom toda furada e uma camiseta que se mostrava alguns números menor do que ele.

Passei algumas horas conversando com o garoto, enquanto o motorista do jornal divertia-se com a maravilhosa Nikon D3. Ao me despedir de Francisco, o pequenino me olhou com os seus olhos negros como a noite e me disse “vota direito, tia. Pensa, porque você tem na ponta do dedo o destino de muita gente, inclusive o meu”! Então me despedi, dando ao garoto os trocadinhos que estavam soltos no bolso do meu casaco, pois ele aparentava um imenso ar de fome. Ele, todo faceiro, saiu depois de catar as sacoladas de santinhos e os seus trocadinhos.

Eu fiquei. Aquela fatídica madrugada – comum para mim, visto meu trabalho - que antecedia a "festa da democracia", me fez pensar no meu voto, no que julguei ser melhor. Eram três os mais cotados para a presidência, porém apenas um ganharia e ocuparia a cadeira mais importante do país. E seria sentado naquela cadeira que decidiria o que é melhor para o Brasil. Para minha esperança (ainda não decidi se é mesmo esperança) a pessoa que prometeu cumprir um sonho de qualquer garoto de oito anos, que é ter uma bicicleta, não foi eleita no primeiro turno.

Quando entrei no Fórum Eleitoral às seis horas da tarde de domingo, dia 3 de outubro de 2010, vi um garotinho que me lembrou Francisco. Me encostei ao lado de uma imensa pilha de urnas eletrônicas que haviam acabado de ter suas fitas impressas. Ao olhar o telão e ver que o segundo turno era real, pensei que ainda haviam esperanças para o futuro de milhões de Franciscos que estão por aí. O sábio garoto teve sua fala mais certeira ao dizer que eu deveria votar direito e que o voto deve ser pensado, pois as rodas da vida irão girar pelos próximos quatro anos de acordo com o caminho que os 190 milhões de brasileiros irão escolher.

Texto: Luiza Slaviero - @luhslaviero

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